terça-feira, junho 27, 2006

Bichos


Vou para o jardim. De flores, árvores e bichos daninhos, de ventos que brincam nas folhas que adornam o dia de céu fosco. Arrasto um peso de memórias que os bichos vão levando, divagando no tempo, guardando nas tocas construídas com o propósito do Inverno.

As memórias, essas, são pesadas. São sempre pesadas. Algumas pesam mais que outras. Com isto não quero dizer que a memória mais antiga que tenha seja a mais pesada. Ou a memória que nasceu agora seja a mais leve.
As memórias são pesadas por elas mesmas, sem se ligarem ao tempo que permanecem. E esse é um mistério que nunca consegui desvendar. Dizem que quando se descobre uma memória, ela atraiçoa-nos, fazendo com que nós voltemos para trás o tempo. O tempo, esse não volta para trás, já dizia o outro. Nós é que voltamos a esse tempo, à procura da nossa existência de uma vida que passou a memória.

Por isso é que gosto de bichos daninhos, como os de conta que se enrolam em bolota, como as minhocas com centenas, milhares de pernas, como as formigas obreiras sem descanso, as abelhas zebra com riscas amareladas, as libelinhas irritantes, os escaravelhos gordos ou mesmo a mais perfeita bailarina dos ventos, a borboleta.
Estes bichos não têm tempo para ter memórias. Quando acaba uma estação, já estão a pensar na próxima. Largam as peles, as couraças e asas para começarem uma nova vida.

Hoje é o começo de uma nova estação. E as formigas não páram de trabalhar de um lado para o outro. Levam as minhas lágrimas pesadas, em entreajuda, para guardarem no longínquo formigueiro. São as reservas do próximo tempo, da próxima estação que virá. Do nascimento de uma nova vida.


Comments:
bem bonito e triste também
 
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